Pagino-me compenetrado,
Cuidando cada parágrafo
Como se coisa definitiva,
Atencioso e solícito
A cada palavra,
Percalço ou impulso
Digitado.
É o livro em que me inscrevo
De tamanho justo e sincero,
Aparado das sobras e pontas,
Do que amealhei inútil, à toa.
Nele não escrevi a vaidade,
A veleidade de me sentir mais,
Descartei complexos e medos,
Expus-me tal qual sou, único,
Na frustração de não ser todos.
Há capítulos toscos e risíveis,
Onde, patético estupefato,
Fiz-me impotente para influir,
Capítulos de lágrimas soltas,
Ensopando papel e olhos,
Comigo flagrado só limites,
Onde não consegui ser maior.
Há amores, muitos amores,
Um corolário de musas que,
Chegando coadjuvantes
Tomaram tudo e permaneceram,
Fixadas em saudades e versos.
Meus pequenos delitos
Temperei mais amenos
E os remorsos estão explícitos,
Fardos que pesam e gritam,
Cobrando-me arrependimento.
Há política, claro, árida arena
Onde empreendi combates,
Empunhando argumentos
Contra armas de verdade,
Duas hospedagens compulsórias,
Entre grades e soldados,
E estragos impostos aos biltres
Que se supunham poderosos.
Como num cepo de açougue,
Retalhado e nu, sangrando
O preço de ter vivido
Ofereço-me, página a página,
Deixando a tragédia que pesa
Para anteceder o ponto final.
Letra a letra, em curta biografia,
Narro perdas e danos,
O que ganhei e o que perdi,
Pondo a alma desnuda,
Para concluir como Neruda:
“confesso que vivi”.
Francisco Costa
Rio, 22/04/2016.
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