quinta-feira, 7 de abril de 2016

VELHINHO AO AVESSO

Arresto do que em mim resta,
arregimento forças, as últimas,
em supremo esforço de velhice,
mas ainda pronto e determinado,
brandindo as palavras, munição.

E eu, que as pensei apascentadas
no rebanho da tranqüilidade,
em descrição do ameno e doce,
as reedito instrumentos de luta,
armas prestes aos disparos.

Em não me queria assim, bélico,
trocando camas por trincheiras,
declarações de amor por tiros,
ainda que verbais, só escritos,
tentando sangrar consciências.

Mas urge que eu me faça atento,
antilírico e lúcido, combatente
em mais um levante imposto
pelos que não se contentam em si,
predando e devastando, destruindo.

Eu me queria um velhinho cansado,
falando de coisas antigas, aos netos,
de chinelos e pijamas, sorrindo
o sorriso calmo do dever cumprido,
mas eles me impuseram a farda.

Um dia, talvez de mim falarão:
vovô morreu digitando,
e a última palavra digitada
foi indignação.

Francisco Costa

Rio, 21/03/2016

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