sexta-feira, 22 de abril de 2016

DIA DAS CRIANÇAS

(O meu dia das crianças)

Crianças, Mestre,
como as que dissestes
que venham a mim.

Crianças, só crianças,
não mais que crianças,
como todas as crianças,
afeitas a sonhos e fantasias,
onde se mesclam sorrisos,
entre a realidade e a poesia.

Mas estas diferentes,
de diferente teor,
edificadas na carência,
na falta de infância
e de futuro, de tudo,
como lagartas condenadas
que nunca voarão borboletas.

Crianças de dores adultas
e perspectivas senis,
nascidas com data vencida,
com vidas abreviadas,
em curta e sofrida ponte
entre o parto e a sepultura.

Pois é destas crianças,
pastos de não virem a  a ser,
que vos falo hoje e agora,
irônico dia das crianças,
projetos interrompidos,
ruínas antes da inauguração,
banquetes sem cardápio
e sem comida, excrescências
no mercado, inúteis e anônimas,
atrapalhando o trânsito.

Os anjos que as guardam,
ausentes ou frágeis, limitados,
garimpam jardins em desertos,
pomares em oceanos, inúteis
como temporais nas praias.

Piedade, Senhor, piedade!
Não para essas crianças,
porque não menos puras
que quaisquer outras crianças,
mas para nós, irresponsáveis
fabricantes dessas crianças,
nas igrejas e shoppings,
compenetrados e impunes,
sorrindo a feliz hipocrisia
dos realizados,
de não as tê-las em casa,
mas longe o bastante
para que não nos incomodem.

Piedade, Senhor, piedade,
por alternarmos versículos
e indiferença, pretensões
de bondade e barbárie,
a barbárie nossa de cada dia,
ostentada em púlpitos
e altares, em camas e mesas,
onde, simbolicamente,
retalhamos corpos
e roemos ossos porque a carne...
Já nasceram sem ela,
tornadas espectros de terror
que não nos aflige,
distantes e apascentados,
saciados, cristãmente
satisfeitos, em oração:
“Pai meu que está no céu,
O pão meu de cada dia,
Venha a mim o vosso reino...
Amém.”

Francisco Costa
Rio, 12/10/2015.






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