quinta-feira, 7 de abril de 2016

Arrasto misérias que não são minhas,
Mas que me deram, compulsivas,
Sem que eu as pedisse ou desejasse.

Como Atlas, sustento o mundo
E nele tudo cabe e mais caberia.

Há a moça, patético romantismo
Que se edifica ambição e posse,
Obriga ao preciosismo do instante,
Referência para a saudade futura.

Há preciosismos, efêmeros e rápidos,
Postos num olhar, em insinuações
Que mais não serão que insinuações,
Apunhaladas por insegurança e medo.

Há o cais inalcançável, as utopias,
As esperanças, preguiçosas e longas,
Nos espaldares das tardes mornas.

Há a possibilidade do Câncer,
Do enfarto do miocárdio, do derrame,
De todas as sombras que aperreiam,
Antes que a memória se apague,
Afogada em senilidade ou Alzheimer,
Apagando os versos de outrora,
Os rostos conhecidos, as referências
Que nos fizeram uno e diferente,
Reduzido a um vegetal na cama.

Há os homens maus, espectros
Nas sombras tramando golpes,
Arquitetando tramóias e traições,
Contaminando os dias e as horas
Com indignação e ódio, maldições
Que logo se concretizam rebelião,
Vendaval que emancipa a justiça,
A paz dos pães divididos, o sono
Reparador do guerreiro cansado.

Há as gaivotas, intermináveis vôos
Na rotina de tecer a manhã,
Infância da tarde
Que envelhecerá noite,
Entre reclamos e delírios.

Há o político de plantão,
Vomitando palavras e perdigotos
Na inauguração da praça pública,
Palco das prostitutas e desocupados
Substituindo as crianças prisioneiras,
Encarceradas em games e shoppings.

Há a maledicência, o boato, a calúnia,
Todo um repertório de difamação,
Em alegoria ao enredo da mentira,
Arma de que se servem os fracos,
Nascidos para amanhecer derrota.

Há a moça que se despe no espelho
E diante de mim se ama narcísica,
Usando meu corpo gratificado e nu
Como fonte e objeto do seu prazer.

Mas há flores salpicando a paisagem,
A sonoridade do passaredo no sol,
O sorriso distraído da criança no sol,
O sol, emancipação das trevas
Exorcizando o que não se quer escuro.

Se prisioneiro de opaca nebulosidade,
Hoje, é porque experimentamos
O desconhecimento de saber do sol.

Mas o sol existe, brilha e nos espera
Cores e formas nascidas da escuridão.

Como afirmou o poeta* e seu violão,
“gente nasceu para brilhar”,
Como estranhos poemas que,
Nascidos tristes, terminam esperança.

Francisco Costa
Rio, 14/07/2015.

*Caetano Veloso

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