quinta-feira, 13 de novembro de 2014

QUIXOTE OCASIONAL

(A todos os meus amigos e amigas que estranharam a minha ausência nos grupos de poetas)

Perdão pela ausência,
Incidental e necessária,
Curta no tempo,
Quase eterna na saudade.

Quixote contemporâneo,
Alimentado a sonhos,
Deparei-me com moinhos,
E só, sem Rocinante e Sancho,
Sem Dulcineias, investi,
Corpo, alma e emoção,
De lança em punho,
Sacrificando sorrisos e versos.

Impotente para controlar a lavra,
Permiti que semeassem moinhos
Onde eu queria flores e fartura,
Crianças correndo, mulheres nuas,
Revoadas de colibris, felicidade
Constante e obrigatória,
Manhãs ensolaradas,
Casais de mãos entrelaçadas,
Esperando para segurar o futuro.

Eram (são) moinhos feios,
Construídos com lágrimas,
Frustrações, carências...
Eclipsando a plenitude do homem,
Órfão por obra dos semeadores de moinhos.

Último país a abolir a escravidão,
Último das Américas, e quase do mundo,
A proclamar a república e se independer,
A instituir a democracia e os direitos,
Amante de ditaduras e fantoches
De potências estrangeiras, distantes,
Os mesmos lavradores de moinhos
Nos queriam em retorno ao antes,
Ao antigamente de infortúnio e dor.

E me esqueci capaz de versos,
De amante dedicado às palavras,
Quase todo e só coração atento,
Colecionando momentos.

Obriguei-me, mais uma vez, à luta
Contra os de mentes tetraplégicas,
Incapazes de avançar para dividir,
E os de corações xiitas, belicosos,
De sentenças ferinas e definitivas,
Inocentes dos beijos e orgasmos,
Reduzindo a vida e seus encantos
A meras operações contábeis.

Meu Titanic é de papel,
Impróprio as grandes vagas
E mar revolto, mas navega
E navegando incomoda,
Multiplicando mil barquinhos de papel
Outros, atravancando o córrego
E inundando o que se queria seco,
Desidratado de sentimentos.

Agora é o intervalo, o armistício.
As pás dos moinhos estão paradas,
Sem ventos que lhes soprem a favor,
Em nova lavra, até a entressafra,
Quando trocarei a minha caneta
Por uma lança de verbos e advérbios
Capazes de ferir os velhos moinhos,
Sabotando-lhes os propósitos.

Despido da espada e da armadura,
Eis-me de novo íntegro e natural,
Quase nu, vestido apenas de versos,
De volta ao convívio de todos os dias,
Quando, amante inveterado
E contumaz, retalho-me inteiro
E espalho pedacinhos por aí.

Francisco Costa.

Rio, 31/10/2014.

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