domingo, 16 de novembro de 2014

A FESTA NÃO ERA PARA MIM

Hoje despi-me do provável
E estive no limbo da poesia,
Descartado da minha porção normal,
Entre homens maiores, gigantes,
De anatomia diferenciada,
Com olhos hipertrofiados,
Ouvidos atentos a tudo
E enormes corações.

Bonachão, com um copo de uísque na mão,
Vinícius pronunciava diminutivos precisos
Para Drummond, como sempre sério,
Talvez imaginando um diálogo impossível
Com Pessoa, outro que desvirtuou tudo,
Colocou a boca nos dedos, falando com tinta.

Mais atrás, Maiakowsky e Lorca exaltados,
Em conspiração permanente, ouvindo
Neruda e seu barrigão de digerir poemas.

Em torno da mesa de doces e infância,
Quintana brincava com um aviãozinho de papel,
Sob os olhares atentos de Bandeira e Osvald
Mastigando qualquer coisa indefinível.

Mais adiante as mulheres fofocando:
Cecília Meireles, Gabriela Mistral,
Florbela Spanca, Cora Coralina...
E o assunto era a essência do belo
E como com ele contaminar o mundo.

Pareceu-me ser uma festa de pompa,
Um evento de rara magnitude,
Para receber alguém importante,
Digno de ambiente tão restrito.

Súbito fez-se silêncio de acordar estrelas,
Tom Jobim apagou o charuto,
Sentou-se ao piano
Teclou o primeiro acorde,
E Manoel de Barros entrou.

E acordei, penetra em festa alheia,
Sem convite e sem méritos, pensando:
- Puxa, pensei que eu é que tivesse nascido!

Francisco Costa
Rio, 14/11/2014.

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