quinta-feira, 27 de junho de 2013

CARPINDO

Tenho invejas, sempre ocasionais
E de curtas durações, passageiras.
A inveja da hora, agora, está no sol,
Carpindo o tempo, o dia, meu quintal.

Monótono e repetitivo, calado e só,
O velho manipula a enxada,
Gume de afiado corte cavoucando.

Invejo-o. Extensão da enxada,
Reduzido a peça na ferramenta,
Ele a manipula distraído, esquecido
De que está vivo, mais que carpindo.

Nele não dói, e se dói dói pouco
Porque só dor física, em calos e cortes.
As dores outras, sem precisa locação,
Estas não lhe doem porque inexistem.

Todas as suas perguntas estão respondidas,
Conceitos simples e de simples compreensão,
Interdito que está ao que julga maior que ele
Concentrado na enxada, monótono e só.

Perfeitamente integrado na ecologia do ser,
Habita só necessidades materiais, comida,
Água, abrigo, beberragens ocasionais
Dopando o corpo no espírito dopado.

Nele não há a possibilidade do Big Bang,
E a estrela de Aldebarã não é hipótese,
Inexiste, diferente da estrela do mar.

Sem filosofias, sociologias, metafísicas
Um velho maneja a enxada,
Capina a minha inveja e o meu quintal.

Francisco Costa

Rio, 16/05/2013.

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