sexta-feira, 28 de junho de 2013

AULA DE ECONOMIA

Façamos o seguinte, então:
você deixa o seu salário comigo,
e vá pegando aos poucos,
de acordo com as suas necessidades.

Enquanto estiver em meu poder
eu emprestarei a dez por cento ao mês,
sem nenhuma compensação para você.

Necessitando sacar, quando precisar,
lhe venderei um bloquinho de papel,
ao que chamam talonário de cheques.

Se não for usar o salário todo, invista,
emprestando-me pelo prazo que eu determinar,
e lhe pagarei um e meio por cento ao mês,
emprestando a dez por cento, claro.

Não se perca nas contas, mantenha-se atento
porque a cada vez que você quiser informações,
de quanto ainda tem comigo, lhe cobrarei.

Pode ser também que eu não empreste no varejo,
a particulares, como você, dinheiro pouco
e sem a certeza do recebimento no prazo aprazado,
quando, recorrendo às leis vigentes, protegido,
cobrarei juros sobre juros, custeio de processo,
correções, emolumentos, taxa de inadimplência...
Vendo-me obrigado a confiscar o seu patrimônio,
sem dó nem piedade, sem medir consequências.

Aí  emprestarei  ao governo,  diretamente.
Após a divisão entre políticos, empreiteiros
e todos os intermediários, sobrará uma parte, sua,
que financiará a produção: o que comes, bebes,
vestes... Enfim, consomes, compulsoriamente.

Claro que os juros, os custos dos financiamentos
estarão embutidos nos preços que pagarás,
quando em atividade de compra nos mercados,
criando uma situação deveras interessante:
Você pagará a mim os juros e custos do dinheiro
que deixou comigo. Elementar, não, meu caro?
Esclarecendo: você empresta a você mesmo e
me paga os juros. Não reclame. Lei de mercado.

O risco no meu negócio? Zero.
Ao contrário dos donos de escolas e hospitais,
de pequenas lojinhas das periferias urbanas,
por exercer atividade essencial, não pago impostos.

Segundo: se eu me mostrar incompetente e leviano,
emprestando mais do que captar, em estelionato,
o governo me socorrerá, recorrendo a outros,
como eu, tomadores de salários, bens e produção,
ou recorrerá ao próprio caixa, desviando legalmente
do orçamento da saúde, infrestrutura, educação.

Pode ser também que o rombo seja muito grande,
fruto de desonestidade ou crise financeira geral,
provocando inadimplência em cascata, de todos.

Aí o governo recorre aos organismos internacionais:
faz empréstimos e me repassa, subsidiado.
Não entendeu, parvo? Emprestar subsidiado
é emprestar cobrando juros menores do que custou;
pegar a cinco por cento e emprestar a dois por cento,
com prazo de vinte anos para pagar, e carência de dez.
Não entendeu novamente?  Enquanto te empresto
por noventa ou cento e vinte dias, eles me dão
vinte anos, com mais dez, trinta, se eu quiser.

Quem paga a diferença do juro subsidiado?
Você, claro, diretamente, nas lojas e mercados,
embutido nos preços das mercadorias,
ou indiretamente, lastimando a falta de escolas,
as filas nos hospitais, as ruas esburacadas, a inflação.

Entende porque pego o seu dinheiro sem pagar nada?
Não, não é roubo. O nome disso é captação.
Entende porque empresto a juros? Não, não é roubo.
O nome disso é spread. Bonito, não?

Eu poderia ser igual a outros, colocar uma arma na mão
e dizer: “não adianta, perdeu. Isso é um assalto”. Mas,
ao contrário, anuncio o assalto no rádio e na televisão,
em belos anúncios de belos carrões, belas casas...
Essas coisas que você jamais terá, não deixarei.
No dia em que todo mundo tiver não empresto mais,
não sou bobo.

E não me chame de ladrão! Sou banqueiro!
Bem sucedido empresário do sistema financeiro!

E se ficou indignado, nem pense em reação:
greves, passeatas... Movimentos sociais.
Eu ponho a polícia atrás. Afinal,
você a sustenta pra isso.

Francisco Costa
Rio, 04/04/2013.


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