(a Pedro
Castello Costa, meu pai, in memoriam)
Sabe, velho,
acho que está chegando a hora de nos encontrarmos.
As dores no
peito estão persistentes, e o doutor foi incisivo:
Do terceiro
não escapa, mas não estou preocupado com isso não.
Continuo
tabagista inveterado e abusando das gorduras e da raiva.
Raiva
política, pai. Mudou muito pouco nesses trinta anos.
Sim,
conforme conversamos, mantive a minha convicção,
Não me
tornei político. É, foram muitas oportunidades e tentações,
Dirigi sindicato,
presidi associação de moradores, dirigi escolas...
Muitos
convites e tentações, ainda hoje, mas resisto.
Manifesto-me
politicamente por outro motivo, velho:
Como afirmou
Millor Fernandes, “só existem duas posições políticas,
A da
resignação e a da indignação”, sem falar do Federico Lorca:
“O poeta é
naturalmente um revolucionário”. Poeta acomodado,
Resignado,
centrado no próprio umbigo é um pobre burocrata
Escrevendo
cartinhas de amor, sabe, pai? Eu jamais conseguiria.
Queria agora
fazer um agradecimento público que não tive tempo,
Você ficou
logo inconsciente, nos estertores da morte
Adejando os
seu lábios duros e frios, sem poder me ouvir:
Lembra das
suas preocupações, e de toda a família, certos
De que eu
não sobreviveria à ditadura, a cabeça a prêmio
E minha voz
desatinada recusando-se ao silêncio e à capitulação?
Você chegou
cheio de cuidados: “meu filho abandona isso,
Contra a
força não há resistência. Você será só um morto a mais,
E nada
mudará.” A minha resposta o surpreendeu e percebi
Suas
lágrimas presas, envergonhadas no seu machismo empedernido,
De falso
durão mastigando sentimentos, mascando decepções.
Lhe
respondi: pai, você me ensinou muitas coisas, mas uma delas
É a maior:
“todo homem tem que ter um ideal e estar disposto
A morrer por
esse ideal”. Eu ainda não era adolescente, mas ouvi,
Guardei,
aprendi... Orgulhe-se, pai, eu aprendi.
Não foi
preciso ter chorado, eu percebi o choro interno, de orgulho.
Lembrei
disso hoje porque há idiotas pedindo o retorno disso.
É a proposta
deles para os nossos filhos, a tortura e o silêncio.
O
agradecimento público, meu pai? Tive muitos professores,
Orientadores,
doutores, mestres... Li muitos livros: teóricos,
Filósofos,
pensadores... Mas a maior lição me foi dada por você.
Nenhum
superou aquele maluquinho de guerra, analfabeto,
Cheio de
verdades que a vida me mostrou serem falsas, exceto
A de que
todo homem deve ter um ideal e estar disposto a morrer por ele.
A maior
lição na vida, quem me deu foi você, meu pai.
Beijões. Até
já.
Francisco
Costa
Nenhum comentário:
Postar um comentário