Quero escrever, preciso escrever,
Cantar o amor em suas variáveis
Em fragrante de delito, nas camas
Em parques públicos, estacionamentos,
Ruas escuras, carros, salas de
cinemas.
Eu preciso cantar o amor, não importa
Se com sensualidade ou obsceno, puro
Ou
lavado de lascívia e sem pudores.
Sou exigido, ordenam-me, pedem:
Cante, cante o amor, destila
Na tarde teus instintos ferozes
De touro apascentado e contido.
Mas não posso, eles não deixam.
Continuam acampados no meu poema,
Levando-me a sentimentos outros,
Deixando que eu veja mazelas, chagas
Lágrimas empapando os dias, as horas
Mortas de ansiedade e raiva.
São os donos da gente, os donos de
tudo
Semeando miséria e colhendo moedas,
Os porteiros da desgraça, os recepcionistas
Da tristeza que se estampa nos olhos
de todos,
Os fabricantes de órfãos e
indigentes.
Quero cantar o amor, preciso cantar o
amor
Mas quando me mostram corpos nus
Não são corpos de curvas e
reentrâncias,
Quentes, úmidos, perfumados, prontos
Ao toque, para que se abram, sensuais
Numa doce e consentida violação.
São corpos tiritando de frio, em
andrajos
Barrigudos, uns, de vermes e
carências,
De futuros filhos da fome, outros.
São corpos magros, esquálidos,
ossudos
Como se nas antecâmaras da morte,
Só aguardando o momento do esgar
final.
Quero cantar o amor, juro, eu quero.
Mas uma legião satânica, macabra
Impede refeições e orgamos,
incipiente
Plantando versos de tristeza e
revolta
Que me escondem o corpo da mulher
amada.
Como ei de cantar o amor, buscar o
gozo
Estético, o gemido doce da poesia,
Os arfares e contorções do momento
Se estáticos, diabólicos, cruelmente
desumanos
Eles insistem em não deixar o meu
poema?
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