segunda-feira, 20 de maio de 2013

RETORNO AO MAM


“Do nada te levantas
                                                             e vais subindo,
                                                             e eu vou contigo
                                                             atento à tua fúria.”
                                                                  (Ledo Ivo)

Quando, só,
Tornar ao aterro
E contemplar o museu,
As ruínas de mim,
As ruínas de nós,

Em acrílico e concreto
Displicentes e fatigados
Meus pedaços espreitarão
Seus gestos vespertinos
Emoldurados na tarde.

E se lembrará, tarde
Dos temas de novelas
Assoviados em surdina
Cadenciando nossos passos
De seres alheios e mudos
Em comunhão de delírios.

                 (não éramos humanos,
                  Ignorávamos as horas
                  E a semântica dos compromissos)

Súbito perco o meu corpo
E sou esse museu, esse mar
Essas palmeiras se alimentando
De sons urbanos e cores
Encarceradas nos letreiros.

Há em mim um comboio
De sensações descarriladas,
Um vendaval de sombras
Um anjo cruel carregando
A minha displicência perdida. 

E choro e me amo e morro
Numa tecitura de meticulosas
Pétalas ornamentando o vazio.

Por onde andará Grega?
Em que tema insonhado
Em que verbete perdido
Em que galáxia distante?

Mas, ei-la!
Lá vem ela, desarmada
No esplendor de outubro,
Humilhando as nuvens
Na sua leveza de garça
Infensa ao cotidiano
De sacrifícios e doações.

Ei-la, de lábios crispados
E gestos desconcertados
Aguardando a hora última,
Definitiva e embriagadora
Como um  verso interrompido
Num bilhete de suicida.

Ei-la, chovendo
Purpurina e sal
na minha saudade.

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