terça-feira, 7 de maio de 2013

ODE AO LIVRO


Restrito a só um corpo e ansiedades,
estaria eu condenado a só mais um,
mero mamulengo nas mãos da vida,
não fosses tu, amante amigo,
cúmplice em tapas e beijos,
em casamento duradouro e estável.

Preso em  tuas mãos caminhei reinos
de impossível suposição fora de ti
penetrando portas e janelas, umbrais
onde se escondem possibilidades
e se revelam verdades, óbvias e reais.

Em tuas asas voei espaços imaginários
e conheci fórmulas, e princípios, e leis,
e postulados, e teoremas, e axiomas,
e dísticos, ditados, verbetes, poemas
romances, contos, crônicas, tratados...
Todo o capaz de romper correntes,
anular a gravidade, fazer levitar,
enlevado e surpreso em tuas páginas.

Em momentos de só carne e desejo
eu te abri como se abre pernas,
e sôfrego, arfando animalidade
e energia vital, amei imaginações,
apaixonei-me personagem,
jurei-me a persecução do só criado.

Presença constante, viajamos juntos,
em ônibus, barcos, aviões... No tempo,
fazendo do tédio viagem interior.

E junto permanecemos, tu na cabeceira,
enquanto eu dormia o lido, sonhando
tuas palavras no mais íntimo de mim.

Mesmo quando explodi em indignação,
os hormônios da raiva empapando órgãos,
e me lancei ao mundo em palavras ditas,
escritas, foi repetindo o que aprendi em ti.

Isso! Sou teu plágio, eco de afirmações,
constante repetir do pescado em teu mar,
não mais que teus parágrafos e capítulos
exercitando-se sonoridade no mundo.

Por isso me curvo hoje, senhor e escravo,
parasita parasitado, amante inimigo,
fazendo de mim mais que comum,
só mais um, como um primata
de terno, não saber e gravata.

Sem tua existência permanente,
em todos os instantes,
diuturno e constante,
eu estaria mutilado,
com um pedaço do espírito amputado.

E se um dia, morto,
saído daqui,
me perguntarem
o que fiz de bom,
responderei: amei e li.

Francisco Costa
Rio, 23/04/2013.

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