quarta-feira, 15 de maio de 2013

MEU TEMPLO


Meu templo se ostenta em estranhos ícones.
Em cada andor uma divindade a me orientar:
Logo na entrada, pela ordem, Pablo Neruda
Sobre uma toalha cerzida com as águas do mar;
Adiante, Drummond, pendurado nos óculos,
Intermédio entre seus olhos e a poesia;
Mais além, Pessoa, que por não se bastar
Fez-se muitos, em pseudônimos e personalidades;
Um pouco atrás Cecília Meireles, a santa cigana,
Ao lado de Florbela Spanca e Cora Coralina
Abençoando em versos o transeunte distraído.

Do outro lado, Verlaine e Apolinaire, Rimbaud,
Como se em conclave, editando bulas poéticas;
E vem, sempre pela ordem, Brecht e Maiacovsky,
Uns haikaianos budistas, alguns cordelistas,
Cantadores de feiras, partideiros, repentistas.

No altar mor, o principal, Gandhi, Marx e Einsten,
A humaníssima trindade iluminando o templo
E seus fiéis de canetas na mão, redigindo poemas,
Abaixo assinados, manifestos, em louvores
Na forma de cantos revolucionários.

A frequência de fiéis é cada vez menor.
Inauguraram um shopping ao lado.

Lá os altares são envidraçados,
Protegendo santos manequins
No oratório das promoções.

Aqui a luz rasga vitrais e ilumina consciências.
Lá a luz nasce nos interruptores
Para alimentar inconsciências.

Aqui o homem se faz com idéias e sentimentos,
Lá, com objetos e coisas.

Aqui os homens choram.
Lá, sorriem. De quê?

Francisco Costa
Rio, 15/05/2013

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