terça-feira, 7 de maio de 2013

HOJE, DIA DA HIPOCRISIA (Dia do Índio)


Dia do Índio, um único e isolado,
para lembrar que, antes dos brancos,
civilizados, honestos, corretos,
carregados de bons propósitos,
o ano inteiro era ano de índio.

Um dia para disfarçar em homenagens
a hipocrisia, a covardia, os insultos
impostos aos órfãos de almas
porque não cristãos (palavra de Jesuíta).

Um dia para esquecer compulsoriamente
que doze milhões no dia 22/abril/1500,
hoje reduzidos a trezentos mil
espalhados em favelas, acampamentos
de sem terra, palafitas, lixões... Em órbita
de seculares necessidades, apartados
da sociedade branca e mortos, enterrados,
nas pré-históricas sociedades indígenas.

Dia para esquecer bacamartes e caravelas
cuspindo fogo sobre eles; madeireiros
cuspindo fogo sobre eles; loteadores
clandestinos cuspindo fogo sobre eles;
garimpeiros cuspindo fogo sobre eles;
mineradoras cuspindo fogo sobre eles.

Não bastasse, agora toda a sociedade
dita organizada: hidrelétricas
inundando aldeias, tabas, solos sagrados
para iluminar cidades e obscurecer consciências;

esticando latifúndios de gado e soja
como colcha de seda importada
sobre colchão de palha, escondendo
miséria e podridão em pretenso luxo.

Estrategicamente, ainda que não voluntário,
dia 19, dia de índio; dia, 22, descobrimento
do Brasil, de um país de índios a ser conquistado.

Véspera de índio, dia seguinte e todos os seguintes,
dias de abater índios.

Em atestado de coerência na rapinagem e no saque,
tramita no Congresso Nacional Brasileiro
projeto de lei tirando da FUNAI
(Fundação Nacional do Índio)
a atribuição de demarcar terras indígenas,
passando-a para o próprio Congresso Nacional.

A partir de agora, latifundiários ávidos por terras
demarcarão as terras indígenas;
pastores insatisfeitos com a ausência de dízimos
e ofertas coletadas em aldeias, julgando-os
demoníacos por não conhecerem Jesus,
demarcarão as terras indígenas;
lobies de mineradoras, madeireiras, concessionárias
de serviços de eletricidade demarcarão as terras
dos que um dia foram proprietários de tudo, agora
encurralados em exíguos quintais, perambulando.

Tudo agora na mão de corruptos, ladrões,
urubus ávidos em transformar carniça em dinheiro,
impedir a restauração da sensatez e da honestidade.

Esses mesmos estarão, hoje, destilando hipocrisia,
sordidez, em sessão solene no Congresso Nacional,
em homenagem aos índios.

Mas hoje também comemoramos aniversário,
e de poeta maior, Manuel Bandeira (107 anos, se vivo).

Como então não encerrar esse anti poema
com palavra tão cara e tão presente em seus poemas?
Caralho!

Francisco Costa
Rio, 19/04/2013.

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