Dia do
Índio, um único e isolado,
para lembrar
que, antes dos brancos,
civilizados,
honestos, corretos,
carregados
de bons propósitos,
o ano
inteiro era ano de índio.
Um dia para
disfarçar em homenagens
a
hipocrisia, a covardia, os insultos
impostos aos
órfãos de almas
porque não
cristãos (palavra de Jesuíta).
Um dia para
esquecer compulsoriamente
que doze
milhões no dia 22/abril/1500,
hoje
reduzidos a trezentos mil
espalhados
em favelas, acampamentos
de sem
terra, palafitas, lixões... Em órbita
de seculares
necessidades, apartados
da sociedade
branca e mortos, enterrados,
nas pré-históricas
sociedades indígenas.
Dia para
esquecer bacamartes e caravelas
cuspindo
fogo sobre eles; madeireiros
cuspindo
fogo sobre eles; loteadores
clandestinos
cuspindo fogo sobre eles;
garimpeiros
cuspindo fogo sobre eles;
mineradoras
cuspindo fogo sobre eles.
Não
bastasse, agora toda a sociedade
dita
organizada: hidrelétricas
inundando
aldeias, tabas, solos sagrados
para iluminar
cidades e obscurecer consciências;
esticando
latifúndios de gado e soja
como colcha
de seda importada
sobre
colchão de palha, escondendo
miséria e
podridão em pretenso luxo.
Estrategicamente,
ainda que não voluntário,
dia 19, dia
de índio; dia, 22, descobrimento
do Brasil,
de um país de índios a ser conquistado.
Véspera de
índio, dia seguinte e todos os seguintes,
dias de
abater índios.
Em atestado
de coerência na rapinagem e no saque,
tramita no
Congresso Nacional Brasileiro
projeto de
lei tirando da FUNAI
(Fundação
Nacional do Índio)
a atribuição
de demarcar terras indígenas,
passando-a
para o próprio Congresso Nacional.
A partir de
agora, latifundiários ávidos por terras
demarcarão
as terras indígenas;
pastores
insatisfeitos com a ausência de dízimos
e ofertas
coletadas em aldeias, julgando-os
demoníacos
por não conhecerem Jesus,
demarcarão
as terras indígenas;
lobies de
mineradoras, madeireiras, concessionárias
de serviços
de eletricidade demarcarão as terras
dos que um
dia foram proprietários de tudo, agora
encurralados
em exíguos quintais, perambulando.
Tudo agora
na mão de corruptos, ladrões,
urubus
ávidos em transformar carniça em dinheiro,
impedir a
restauração da sensatez e da honestidade.
Esses mesmos
estarão, hoje, destilando hipocrisia,
sordidez, em
sessão solene no Congresso Nacional,
em homenagem
aos índios.
Mas hoje
também comemoramos aniversário,
e de poeta
maior, Manuel Bandeira (107 anos, se vivo).
Como então
não encerrar esse anti poema
com palavra
tão cara e tão presente em seus poemas?
Caralho!
Francisco
Costa
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