terça-feira, 7 de maio de 2013

DE CERCAS E SECAS ("Que país é esse?" - Cazuza)


O nordeste brasileiro está passando pela pior seca
dos últimos quarenta anos e nem o povo brasileiro sabe.
A mídia noticia futebol, escândalos políticos, bandidagem,
quando conveniente, trivialidades do higt society, BBB.

Há fome, há miséria, há seres humanos morrendo
e ninguém fala. Se é cruel morrer de sede, mais cruel
morrer a dois ou três metros da água abundante,
cristalina e fresca, jorrando de poços artesianos
cavados com dinheiro público.

E porque não bebem essa água essas crianças?
Porque entre a sede infantil e a água há cercas,
capangas armados, garantindo a água
que mata a sede do gado do latifundiário.

Malditos sejam esses que se beneficiam da morte,
edificam patrimônios sobre cadáveres de crianças
e comem carniça humana, e bebem sangue infantil.

Mil vezes malditos os de vistas grossas,
legislando em favor das fortunas,
aplicando leis em favor dos afortunados,
executando as leis para garantir isso,
a continuidade e a eternização da miséria.

Que país é esse, desgraçado por políticos,
administrado como se empresa particular,
sem contabilidade e controle de caixa,
onde o furto, a apropriação indébita,
o roubo, o saque, as propinas e cala bocas
fazem-se moeda de troca, escambo sujo,
como se euro, dólar, ouro ou real?

Que país é esse onde as maiores fortunas
repousam em mãos de coronéis nordestinos
que antes da primeira posse em mandato eletivo
eram tão miseráveis quanto os miseráveis de agora?

Que país é esse permissivo, fazendo de líderes
de seitas e religiões, arquimilionários?
Que país é esse que exige três condenações prévias
na suprema corte da justiça, para habilitar
um verme como presidente do Senado?

Que país é esse que exige dos seus  mandatários
passado porco, eivado de processos tramitando,
ou tramitados em julgado, para nomeações e posses?

Que país é esse, presidido por ex comunista
que foi às armas, conheceu a tortura,
defrontou-se com a morte, por pouco sucumbindo,
com a proposta de exterminar os aliados de hoje?

Que país é este, digam-me, porque não foi onde nasci,
onde soletrando as primeiras letras, orgulhoso
conheci heróis, mártires, guerrilheiros, revolucionários.

Não! Definitivamente este não é o meu país.
O meu morre de sede, perambula no pasto da fome,
mora nas favelas, mastiga necessidades e carências.

O meu país dorme, inconsciente e calado,
embalado pela mídia vendida,
por um sistema educacional que o amansa e amestra,
por um sistema de saúde que o mata.

Não há sono eterno, senão na morte,
e um dia, tenho certeza, irá acordar.

Não será mais o país das secas e cercas,
mas de quem nele e por ele trabalhar.

Francisco Costa
Rio, 10/03/2013.

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