Hoje, cá, é
Dia Internacional das Mulheres, sabia?
Acordei mais
cedo e, ao invés do cafezinho costumeiro,
antes do
primeiro cigarro, fiz café para nós dois.
Vê se pára
de reclamar que não faço nada,
quero tudo
na mão, paxá (palavras suas)
envolvido
com política, pinturas e versos.
Perdão. Só sei ser assim.
Afastei as
poltronas da sala, pus o disco para tocar
e, mais uma
vez, a convidei para dançar.
Enquanto nos
embalávamos, um filme louco,
conto de fadas
no início e tragédia no fim,
passou por
minhas retinas embaçadas, opacas,
porque
presas numa cortina de lágrimas.
Lembrei de
você toda suada, vermelhona e cansada,
capinando a
beira da calçada, me ajudando,
desajeitada,
a colocar o telhado no galinheiro.
Irada
gritando que eu só vivia cercado de vagabundas,
comigo rindo
porque se existe alguma coisa engraçada
é mulher
enciumada, “vou acabar com a sua raça”,
e eu rindo,
imaginando você em casa, rádio baixinho,
navegando em
música, acompanhando o programa,
do primeiro
minuto ao último, atenta aos comentários,
vigiando
cada telefonema de cada ouvinte a mim...
Era
engraçado, e eu não tinha noção de que em você doía.
Consegui rir
da tua irritação quando surpreendida,
distraída,
por uma palmada minha, e fui à nossa miséria,
jantar de
arroz na água e sal com uma rodela de tomate
cru,
insosso, estranho porque mais só o do leite em pó
amamentando
nossos meninos no berço.
Vim também
ao agora, esse patrimônio vazio de você,
invejável a
todos mas que não me diz nada, me isolei,
passei para
os nossos filhos e vim para o sítio, sonhar,
viver comigo
mesmo porque mais não sei, desaprendi.
Perdão pela
indiscrição, mas a vi nua, suada, cansada,
enciumada
(até nesses momentos?), rogando praga:
ei de te ver
careca, rouco e barrigudo, comigo rindo,
retribuindo:
e essa berruguinha no seu nariz, vai crescer,
ficar igual
a uma bola de pingue pongue, e vai engordar,
não vai mais
ouvir piadas quando passar. E ríamos, ríamos
antevendo
mais risos e sempre até a velhice, etername...
Até o dia em
que displicente, com a naturalidade do alheio
atendi ao
telefone, nossa filha mais velha aos gritos,
em pranto
desmedido: “pai vem que minha mãe faleceu”.
E para mais
doer, dando a dimensão exata da orfandade
completou:
“te cuida paizinho porque agora só temos você”.
Minha
vontade foi sair quebrando tudo, chutando tudo,
rasgando
tudo, a começar por mim, impotente,
naquele
momento nada, chamando Deus pra porrada.
Sei que você
vai ficar com raiva, mas não vou esconder:
hoje fiz muitos
versos e os espalhei por aí, lidos no rádio,
curtidos e
comentados no face, postados em murais...
É. Dei
versos muitos à mulherada, mas esses guardei.
É quase
prosa, despidos de imagens poéticas, pleonasmos,
Sinédoques,
aliterações e eufemismos. Aqui não valem,
são versos
sem passagem pelo crivo da razão, sem revisão.
São seus,
pega-os com cuidado, podem se desmanchar.
Estão muito
molhados. Não repare, são minhas lágrimas.
Francisco
Costa
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