Como Se Fosse Oração
Senhor,
livrai-me das certezas do meu tempo,
desse estar
politicamente correto porque em silêncio
e acorde que
cada um é um, com fim na própria pele,
e o outro um
estorvo a ser combatido ou doutrinado.
Escondei-me
dos espelhos, das estéticas, das dietas,
do culto ao
próprio corpo a ser emusculado,
lipoaspirado,
transpirado, modelado nas academias,
como pau no
torno ou barro nas mãos do oleiro.
Livrai-me
dos que fazem Deus à própria imagem,
à semelhança
dos próprios gestos miúdos, egoístas
porque
presas do que é comum, trivial, cotidiano...
E dos ateus,
no extremo oposto, explicando-se inteiros
no acaso, no
sei lá e no me escapa ao pensamento.
Daí-me
coragem, não para conquistar, amealhar,
mas para
suportar esse triste mar de ideias mortas,
sem marés e
sem marolas, sem sol, uma triste praia
de banhistas
padronizados e iguais, repetindo-se.
Continuo a
acreditar no amor, apesar de tudo isso,
sem ter como
vê-lo só afogado em hormônios,
anunciado em
orgasmos, realizado no carro novo.
Acredito no
amor como num ar oculto, sem o qual
não
viveríamos porque impossibilItados de respirar.
E assim como
o ar que ainda a pouco estava em mim,
habitando os
meus pulmões e já daqui a pouco,
sem que
percebamos, estará em outro, o amor,
essa coisa
gasta porque decantada em vão, transita
em todos,
ainda que imperceptível, para permitir a vida.
Senhor,
permita que eles venham a saber disso um dia.
Francisco
Costa
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