sábado, 30 de novembro de 2013

RÉ PÚBLICA

Que pelo menos no dia de hoje
Se restaure a dignidade da verdade
E se diga às crianças que a História
É só a versão do vencedor.

Vamos demolir mitos,
Caracterizar a verdade,
Desmascarar a mentira:

Portugal não descobriu o Brasil
Porque inscrições nas pedras
E mapas anteriores a 1500
Mostram chineses e fenícios
Passeando por aqui.

Independência por amor a nós
Ou o príncipe preservou território,
Certo de que Napoleão cearia
Nas mesas e camas da Península Ibérica?

Proclamação da República por anseio
Popular ou golpe militar, o primeiro
Como primeiro degrau de próximos?

Tiradentes pobre coitado?
Dentista, rico, dono de tropas de burros
Transportando gemas preciosas e ouro,
O equivalente a hoje dono de caminhões,
Insurgindo-se não por amor à pátria,
Mas pela indignação contra portugueses
Investindo pesado em seus bolsos,
Lapidando impostos escorchantes
No que chamavam Derrama.

Período revolucionário? Revoluções
Pressupõem mudanças
E não a manutenção do status quo.
Foi golpe militar mesmo, traição
Ao presidente da república, insubordinação,
Motim cotra o comandante em chefe
Das forças armadas, a serviço do Império,
Ordenado e dirigido pelo Pentágono.

Mas há mazelas piores e que fedem,
Devidamente escondidas sob tapetes:
A tríplice Aliança, a Guerra do Paraguai:
Solano Lopes fechou fronteiras,
Mandou seus jovens para a Europa,
Para estudar e voltarem aptos na ajuda,
No fomento do progresso.
Fez a primeira reforma agrária na América,
Buscou a modernização e a igualdade,
E a Inglaterra, os Estados Unidos da época,
Armou Argentina, Uruguai e Brasil,
Lançando-nos como cães raivosos
Sobre a primeira Cuba do mundo.
Houve raptos, saque, tortura, mortandade
Tanta que ainda hoje se recuperam.
Houve casos de milharais incendiados
Para queimarmos crianças e mulheres,
Velhos escondidos, querendo viver.

Mas tivemos também um Paraguai interno,
Canudos. Apoiado no que diz a Bíblia,
Acreditando que tudo é coletivo e comum,
Pertencente a todos, um fanático religioso,
Segundo os historiadores burgueses,
Resolveu criar uma república independente
No sertão, nos moldes dos primeiros cristãos,
Comunistas em partilha de peixe e pão.
Percebendo que a ideia crescia e logo seria
Mais que regional, nacional, estropiaram-nos,
Inaugurando o primeiro Araguaia,
Mais uma guerra paraguaia, até só restarem
Uns poucos, com armas artesanais e sem água,
Contra todo um exército em fúria e ódio.

A anexação do Acre, em troca
De uma estrada de ferro
Ligando nada a merda nenhuma,
Para escoar contrabando.
Isso depois das autoridades bolivianas
Serem corrompidas por bom dinheiro.

Na história oficial a classe dominante se justifica.
É preciso acordarmos os nossos heróis,
Tirá-los do anonimato dos vencidos
E mostrá-los em toda a sua integridade,
Percorrer senzalas e quilombos e descobrir
Os muitos Zumbis dos Palmares,
Os enumeráveis Antonios Conselheiros,
Os Virgulinos Lampiões, Robin Hoods tropicais,
Os torturados e mortos nos cárceres
Da ditadura militar, os execrados
Em processos forjados, com autos adulterados.

É preciso inaugurarmos a dignidade nacional
E suprimirmos do vocabulário o que os convém:
Um povo preguiçoso e malandro. Como,
Se a sexta potência econômica do planeta?
Acaso quem transforma solo em riqueza
E se desfaz pondo de si no que fabrica
É o empresário, o líder religioso...
Os que fazem do produto de todos seus uso frutos?

Nordestinos burros, negros inferiores,
Mulatos incompetentes, índios inúteis,
Povo cordeiro, todos desonestos...

Onde está a desonestidade senão nos terroristas
Da verdade, nos que nos pintam assim
Para justificar as próprias consciências
Acusando pelos maus tratos e a exploração?

É preciso ensinar às nossas crianças a verdade.
Só assim nos olharemos nos espelhos com orgulho,
Deixando de fazer feriado no dia da Ré Pública
Para comemorarmos a Proclamação da República.

Francisco Costa.

Rio, 15/11/2013.

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