sábado, 30 de novembro de 2013

Ó O NATAL AÍ

Lá vem dezembro
Com o seu ar cínico de sempre,
Repetindo-se constante
Como um teste de nervos.

As pessoas agora vão se despir
E por nas gavetas do esquecido
O que lhes apoquenta e incomoda,
Faz comum e natural.

O moço de grandes bigodes
E calças largas, de brim,
Percorrerá ruas e avenidas,
À caça de bundas e sorrisos.

A moça pudica e sonsa descobrirá
O cosmético mais afrodisíaco,
A roupa mais insinuante,
O deleite de se saber masturbada
Em cabeças anônimas e mãos.

A religiosa correrá lojas e magazines,
Em busca da bênção mais abençoada,
Embalada em sacolas plásticas
A serem postas nos pés da árvore.

O menino de boletim azul
Exigirá a paga pelo desempenho,
Aquele game de porradas e tiros,
O tênis de marca, a viagem prometida.

Enamorados irão aos floristas
E poetas ornamentarão versos
Com bolinhas multicoloridas e algodão,
Alguém acenará um lenço branco
À moça na janela, úmida e arrepiada.

Continuarão a chegar notícias na tevê
Dando conta de natais bélicos
E reveillons travestidos de armagedons,
Com o solo enfeitado em vermelho
E uma pirotecnia macabra no céu.

Corruptos diluídos em uísque
Combinarão as tacadas do ano seguinte
E no face esquerda e direita continuarão
A esgrimar com espadas de papel,
Trocando revoltadas palavras, estéreis
Como úteros secos de velhas mortas.

Tudo entre gatinhos, versículos,
Boas noites e bons dias, declarações
Públicas de sexo privado, protestos,
Belas flores e belas coxas, tudo belo
Porque visto com olhos seletivos,
Apartando a merda da merda.

Nas favelas da vida, aos magotes
As carências de tudo mastigarão
O churrasco na laje, nas calçadas,
Cuidando de vigiar a polícia
Porque hoje mais feroz e covarde,
Revoltada por trabalhar em feriado.

Os shoppings estarão lotados, cheios,
Formigueiros de insetos automáticos
Buscando açúcar nas vitrines decoradas,
Evocando matemáticos e calculistas
Em intricados cálculos do rombo
Que se anunciará em janeiro.

Na manjedoura, com pouca roupa
E já se esperando chagas e cruz,
Um menino faz sua primeira oração:
- Não vai adiantar nada, Pai.
Eles são surdos. Apedrejam César
Mas não deixam de lhe tomar a bênção.

Francisco Costa

Rio, 28/11/2013.

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