“Nunca
espere que um militar pense.”
(George
Bernard Shaw)
Eu poderia
falar da tortura como instituição,
A mórbida
necessidade de despir o homem
Do que o faz
humano, reduzindo-o a nada,
A uma
carcaça de pele e ossos sem vontades.
Eu poderia
falar de milagres econômicos,
Da doação de
muito a troco de pouco,
Mas em
quantidade tanta que permita
O
crescimento dos tomadores de créditos
A serem
pagos pelos que não usufruíram.
Eu poderia
falar da humilhação da rendição,
Do servir de
pasto internacional, pisoteado,
Em oferenda
de minérios e colheitas, safras,
A preço vil
e quantidade ilimitada, sem fim.
Eu poderia
falar da expropriação do trabalho,
Da radical
fabricação de miseráveis, pobres,
Dos milhões
de mortos de fome e carências,
Dos menores
salários da história republicana.
Eu poderia
falar da corrupção em voracidade
De saque
continuado: Ponte Rio-Niterói, Angra,
Nióbio de
Araxá, Manganês da Serra do Navio,
Ouro de
Serra Pelada, escândalo Coroa-Brastel,
Conta CC-5,
da fabricação de milionários, ricos:
Bonhausen,
Maluf, Sarney e os mais muitos.
Eu poderia
falar do arbítrio, da revelia, do revel
Das leis, do
fim do Habeas Corpus, das eleições,
Com
nomeações de senadores, governadores...
Dos mais
incompetentes e alinhados em posse
De secretarias,
autarquias, estatais, diretórios...
Onde
houvesse um generoso livro caixa aberto.
Mas acampo
em aspecto outro, o do ridículo,
Do risível,
da mediocridade em estado máximo
Exercitando-se
na censura, na castração, na poda
Do que se
insinuasse pelo menos vestígio
De qualquer
coisa cheirando a inteligência,
Sensibilidade,
inspiração, liberdade criativa.
Os ditadores
odiavam o que não entendiam,
E só
entendiam de armas e ordens unidas,
Então era a
tesoura podando frases e versos,
As canetas
hidrográficas mutilando palavras,
Os ofícios,
éditos, memorandos e portarias
Vetando
livros, peças de teatro e até novelas.
Era o
sargento analfabeto soletrando Drummond,
Para dizer
que o verso era imoral, atentatório,
Porque
trazia a palavra bunda, um atentado moral.
O cabo
especialista em cem metros rasos, bem raso,
Interditando
o que não entendia ou supunha ser,
Para evitar
complicações com seus superiores.
A foto da
modelo em trajes sumários, recortada
Porque capaz
de incitar o sexo, a permissividade,
Incutindo
nas crianças o comunismo e a tara,
Nos fazendo
imaginar que militar fode de farda.
Neologismos
suprimidos, arrancados dos textos,
Porque se
não existiam nos dicionários, suspeitos;
E tudo o que
não entendiam cortavam, mutilavam,
Reduziam,
colocando todos os artistas sob suspeitas.
Orações sem
sujeito? Insinuação contra a pátria,
Atentado ao
regime institucional, subversão;
Verbos no
futuro do pretérito? Drible na censura,
Quando dizem
que seria estão dizendo que será,
Falando em código
para os intelectuais e resistentes.
Cada censor
era um macaco numa loja de louças,
Fabricando
cacos, estilhaços, pedaços, partes
Do que
nasceu íntegro porque fora da compreensão
De gorilas
comandantes e micos subordinados.
E misturávamos
ódio pela submissão ao medíocre
Com
gargalhas diante da própria mediocridade,
Retrato de
um tempo que por lógica e necessidade
Deveria
estar morto, mas que sobrevive em saudade,
Em cada
peito cruel, sádico, e mentalidade medíocre.
Todo tirano
é ridículo, risível na impossibilidade
De submeter
o que é maior que ele.
Seus
discípulos os imitam, substituindo a razão
Pelo repetir
do mesmo, mostrando a nulidade que são.
Francisco
Costa
Rio,
30/03/2014.
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