sábado, 19 de novembro de 2016

OUVINDO ELVIS

Cadê as meninas que adolesceram comigo,
Entre floreiras com margaridas e sonhos
Nutridos no sempre adiado, agora não,
Quem sabe um dia... Com os dias passando
E o passado crescendo, até tomar tudo?

Que fizeram com as meninas de ontem,
Lindas, nos escaninhos da minha memória,
Desafiando-me a lembrá-las todas
Nesta nostálgica manhã de sol e saudades?

Quantas ascenderam à felicidade,
Dominantes e realizadas,
Debulhando rosários de sorrisos?

Quantas se abstiveram, envergonhadas,
Transferindo a existência para a imaginação,
Curiosas e aflitas, nutrindo-se no cardápio,
Sem saber de refeições reais e realizáveis?

Quantas envelhecem, senhoras,
Entre parcimônia e netos,
Cuidando para que tudo ficasse como sempre,
Em burocrática monotonia,
Bibelôs nas prateleiras dos móveis, imóveis
E passivas, nas mesmas posições da véspera?

Quantas ousaram, e ousando se libertaram
Dos preconceitos que cultivávamos,
Lavradores da moral imposta e exigida
Pelos das gerações anteriores,
Atentos ao nosso erotismo escondido,
Assumindo-nos com parcimônia e cuidados?

Quantas são hoje saudades dos filhos
Diante de fotos e objetos cultuados
Porque foram da mamãe ou da vovó,
Santas mulheres que os deixaram
Em orfandade explícita e compulsória?

Quantas não suportaram o próprio peso
E se escoraram em teologias e exegeses,
Repetindo mecanicamente os textos
Que as antecederam e nos sustentaram
Parcialmente castrados, querendo vida?

Quantas tornaram- se vovozinhas peraltas
Digitando impropérios na Internet,
Alternando humor e raiva nas redes sociais,
Contemporâneas dos netos em atividade?

Quantas recheiam passeatas e atos,
Com a mesma indignação de sempre,
Impondo-se coluna de sustentação
Entre passivos tijolos?

Pois hoje ressurgiram diante de mim,
Ainda protótipos do que seriam,
Quando alvos dos meus desejos,
Perdido entre floradas de versos
E revoada de pássaros idéias.

Terno e agradecido, meio choroso,
Coloquei Elvis para tocar e,
Em ligeiras curvaturas do tronco
E só insinuados sorrisos,
Tímido e desajeitado,
Uma a uma as convidei para dançar:

“Love me tender
Love me sweet
Never let me go
You have made my life complete…”*

Francisco Costa
Rio, 08/11/20116.


*”Ama-me com ternura/Ama-me doce/Nunca me deixe ir/Você fez minha vida completa...”

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