sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

LÓGICA FUNDAMENTALISTA

Uma fêmea, dessas diferentes e diferenciadas,
Capazes de inaugurar estrelas em simples olhadas,
Com mais curvas que o litoral fluminense,
 Verdadeiro non sense à paixão que traz estampada.

Uma fêmea, mas de cruel defeito a irritar o sujeito:
Cantora de repertório estreito, de canção única,
Sonoro e tonitroante não e não e não, desafio
Para poetas desocupados caçando musas
E fusas, semifusas... Em qualquer canção.

Esmerei-me no repertório da sedução, embora amador,
Cercando com versos, flores, palavras doces, insinuações,
Até que com sorriso encantador cedeu, nos dois sentidos,
Antecipando-me sonhos loucos, expectativas doentes,
Deliciosas e não muito morais alucinações.

Cumpriu, em cadenciado ritmo, em surpreendência:
Não era na canção única que estava a cadência, mas...
(há sempre um desgraçado mais, maisando qualquer prazer)
Após, fez carinha triste, e de dedinho em riste:
- Eu não devia ter feito isso!
- Ora, mas porque, meu amor?
- Estou na igreja!

Ora seja! Afinal sou eu o pecador,
Induzindo-a à carne que doou a Nosso Senhor.

Se não tive empenho e desempenho de Real Madri e Barcelona,
Capaz de colocá-la na lona, acredito que não foi de Palmeiras,
XV de Piracicaba ou Botafogo, perdendo pelas beiras,
Já entrando derrotados no jogo, tanto que não ouvi mais o não.
Teve segunda vez, terceira vez... Sempre com a sobremesa
Da ocasião: - Eu não devia ter feito isso!

Cansado de ouvir o já previamente anunciado,
Perguntei o óbvio a ser perguntado:
- Porque você não sai da igreja?
E a resposta convicta, quase sagrada, cheia de fé,
O que me inundou de gargalhadas, até doer o pé:
- Não posso perder a minha salvação!

Achando que as minhas risadas foram de deboche,
Calou-se, acabrunhada. Resultado: perdi a mulher.

Estou salvo.

Francisco Costa

Rio, 02/12/2014.

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