terça-feira, 18 de março de 2014

Em meu sítio,
Arborizado e de rica fauna,
Há um cantinho cemitério.

É lá que deixo meus pedaços,
Corpinhos mortos, abandonados,
Dos que me coloriram os dias,
Em abanos de caudas, trinados,
Carícias em linguagens próprias,
Que me alentaram em carícias.

É lá que os enterro e me despeço.

Quando bate o cansaço ou a preguiça,
Simplesmente os jogo, abandonados,
E dou as costas, um pouco menor.

Ocasionalmente a vaidade vem me visitar,
Acompanhada da soberba, do egoísmo
E me sinto Petrarca, Dante ou Camões,
Erigindo-me maior e melhor, o máximo.

Quando isso acontece, disfarço
E os vou visitar já anônimos,
Disformes, reduzidos a quase nada.

O periquito, pompom azul de pios
E piruetas nos poleiros, cheira mal,
Reduzido a plumas sujas e disformes.

Fede a cadela que saltitava na sala,
Roçando-se em minhas pernas,
Companheira de lágrimas e redação
De versos tristes, de abandono.

Liquefaz-se, bichado, outro cão,
O meu vigia, amigo que me protegia,
E não berra mais o esqueleto seco
Do que foi uma cabra um dia.

Ali há silêncio e moscas, mal cheiro,
Ocasionais urubus, vermes em ação.

Então volto pra casa, despeço a vaidade
E todos os seus acompanhantes,
Entendendo que sou um deles, disfarçado.

Nem Petrarca, nem Dante, nem Camões,
Só alguém que se ocupa com versos
Enquanto a última viagem não vem.

Francisco Costa

Rio, 11/03/2014.

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