terça-feira, 17 de junho de 2014

Minha pátria navega em sonhos
E se faz rascunho do que virá.

Minha pátria se desenha geométrica
Em curvas que oscilam concretas
Nos monumentos de Niemayer,
E saltam em forma de meninos pobres
Saídos da infância pobre de Brodosky
Para as telas de Cândido Portinari.

Minha pátria se canta em versos secos,
Com rimas pobres de poeira e sede,
Nas penas secas de Patativa do Assaré,
Na viola de cego Aderaldo, no cantador
Da feira e do cordel, dos rimadores
Que fixam as nossas dores no papel.

Minha pátria tem trilha sonora que ecoa
Das cascatas da Serra do Mar e escorre
Para pantanais, pampas, Amazônia...
E vem sorrir nas partituras de encanto
De Villa Lobos, Pixinguinha e Tom Jobim.

Minha pátria tem macumba, maracatu,
Jongo, capoeira, samba e maculelê.
Tem berimbau, pandeiro e atabaque,
Livros sacros e fanáticos, catequistas
E adoradores de púlpitos e altares.

Minha pátria se masturba nas praias,
Em coito com água, areia e sol,
Percorrendo relevos no horizonte,
Escondendo o pudor nas nuvens.

Minha pátria veste tanga, veste terno
Ou não veste nada, em ostentação nua
Do que orienta e inspira, transpira
Sensualidade caminhando na rua.

Minha pátria soletra futuro e espera,
Sabendo exatamente o que quer,
Uma safra de sorrisos e saciedade
Que se semeia hoje nos corações
Ornamentados de verde e amarelo.

Esta é a minha pátria, convergência
De coisas comuns, coletivas, de todos,
Em silêncios domésticos, interiores,
Ou na algazarra das ruas e estádios.

Mas há uma outra pátria, estranha,
Que não é a minha porque de poucos.

Ela se ostenta nos jornais e na tevê,
Se esconde nos palácios e mansões,
Alheia, só recrutando a minha pátria
Quando necessária e subalterna,
Mero objeto de usufruto e fortuna.

Lá na outra pátria falam estrangeiro
E deglutem a frustração equivocada
De serem chamados de brasileiros.

Meu coração habita na minha pátria,
Já os meus punhos e a minha voz,
Exilados no exercício da revolta
Exigem a reunificação urgente
Dos que em mim choram
E dos que em mim esperam
Porque todos uma só gente.

Francisco Costa
Rio, 26/05/2014.

Nenhum comentário:

Postar um comentário