quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

SURREAL

(No shopping)

Amanheci entre o pranto
Que me chega em maré cheia,
Povoada de berinjelas e bagres
E sorrisos de prender o sol.

Vi Jesus no shopping, faceiro,
Em peleja aberta e pública,
Munido de embrulhos e troco,
Um comunista na cruz e renas,
Muitas renas em palmas de bis,
Papai noel montado num jegue,
Entre bundas e rebolados
Coreografando corredores.

Iscariotes estrangulado e bêbado,
Agonizando na vitrine de criptonita
Embalado em tísicas pretensões.

Aleluias e evoés, améns e gritos
Conspirando ataques de Phantons
E armadilhas de alpiste palavras
Aguardando jacarés com mandatos,
Atentos à programação na tevê.

Redivivo em meus anseios, eu vi
O apocalipse espalhando dragões,
Semeando pânico amordaçado
E sexo ostentando-se nuvens,
Plumas no vento, véus errantes
No aguardo de qualquer porto
Seguro ou de castiçais quebrados.

Eu vi o gado contido em paredes
E o estouro da boiada flutuando
Entre etiquetas e promoções,
Profusão de gols e o drible exato
Entornando sangue e fera fúria
Nas arquibancadas de concreto,
Sólido e duro como corações.

Vi papas e pastores, monges...
Todos os nossos condutores.
Cultos, missas, rituais, oferendas
Aos pés do totem de madeira
Com pés de barro e alma de ouro
Clamando clemência e calma:

Tem muita mercadoria,
Vai dar pra todo mundo!

Não bebi nem cheirei coca,
Eu juro. Só fui ao natal!

Francisco Costa

Rio, 23/12/2013.

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