Cá, diante
do mar eu sou o mar,
Essa
monotonia de ondas em vais e vens,
Sempre as
mesmas, lambendo a areia
Em salgados
beijos sem propósitos.
O que trago
de mais belo se esconde.
Minhas
algas, meus corais, minhas anêmonas
Dançam
anônimas porque longe, escondidas
Dos que
permanecem na praia, em sal e sol.
Se a
temperatura e os ventos se alteram
E me
irritam, ninguém culpa a temperatura ,
Ninguém
cobra dos ventos. Dizem é o mar.
Ressacas e
ondas altas? Tudo culpa do mar.
Singram-me a
pele dia e noite, aos milhares,
Milhões, e
se por ousadia ou imperícia
Se perdem no
que ousaram, lá vem acusação:
É o mar, o
cruel fabricante de náufragos,
O que devora
corpos e fabrica viúvas e órfãos.
Por fim,
culpam-me por separar gente,
Apartar
corações, eclipsar olhares,
Esfriar
corpos, impedir sorrisos e orgasmos.
Não sabem
dos meus relevos, não imaginam
As escarpas
que trago em meu seio, o lamaçal,
O relevo
acidentado e a variação climática.
Não fora eu
a cobrir as minhas intestinas
Estranhezas,
tudo estaria mais difícil aos homens.
Mas
maldizem, espraguejam, vociferam...
Esquecendo-se
de coisas óbvias e fundamentais:
Para que
estivessem hoje aqui prontos aos reclamos,
Por nove
meses nadaram num mar interior, uterino.
E livre do
útero, como um veículo a cata de combustível,
Suprem-se de
água e sal, para o provimento da vida.
E se a vida
ameaça migrar, recolher-se ao anonimato,
Logo
emprestam a veia ao soro, transfundem mar
Ao corpo
exangue, para evitar a despedida definitiva.
Isso! Sois
pedaços de mar, meras ondas emancipadas
Que se creem dotadas de razão e livre arbítrio,
Apartadas do
mar, seio, berço, roupa e túmulo.
No dia em
que os homens souberem disso
Estarei fora
de risco, de eternidade garantida,
Imune ao
lixo,a intoxicação, a desertificação
Da vida que
os alimenta e sustenta, abriga.
Mas por
enquanto não, nenhum deles se sabe
Ainda só um
pedaço do mar, só pequeno mar,
Uma pequena
ondinha que não se emancipou.
Quando
souberem todo o oceano será praia.
Francisco
Costa.
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