domingo, 2 de junho de 2013

CONSOLO

Enredado em canções e poemas,
Perdido entre palavras e acordes,
Busco as razões desse romantismo
Que avassala e submete, escraviza.

Volto ao passado, perquirindo,
E me encontro menino na feira,
Apregoando verduras e legumes,
Atento às meninas e suas bolsas,
Vendo-as oportunidades.

Depois de microfone em punho,
Apregoando mudanças nos dias,
Incitando a um mundo novo,
Fazendo-me anteparo da repressão
Armada de moedas e metralhadoras.

Encontro-me em salas de aulas,
Auditórios, em voz solta, esgarçada,
Proferindo sentenças de estupro
Ao que se anuncia feio e frio e findo:
A pobreza, a miséria, a carência
Ornando-se preocupação primeira.

E trancado no atelier, redirecionando
O que os olhos veem, corrompendo
A realidade, subordinando-a a mim.

E em camas, em casa, hotéis, motéis,
Casas outras... Em dádiva permanente,
Experimentando no físico a comunhão
Posta nos discursos, nos textos,
Quadros, gravuras... Todo ao alcance.

Imperativo de mudança, em mim
Acumpliciaram romantismo e dor.

Agora, decrepitude se avizinhando,
Olho para a janela e o sol me avisa:
Não mais fome e sede, insônia. Menos
Maratona de sexo, orgia de sentidos.
Você não aguentaria.

Mas ainda lhe restam os dedos. Digita!
Faz no teclado o que no mundo fazia.
Se já não podes mais a ação,
Podes ainda a poesia.

Francisco Costa

Rio, 20/05/2013.

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