sexta-feira, 3 de maio de 2013

Vinte e Cinco De Abril


Vinte e Cinco De Abril
(Para meus irmãos portugueses,pela ótica dos que invejaram)

Vem, meu filho. Aconchega-te,
papai tem uma história bonita pra contar.
Estás ficando um rapazinho, um homenzinho
e precisas de bons exemplos para imitar.

Vou falar de uma gente de longe, bem longe,
lá depois do mar. Foram ricos e prósperos,
semearam caravelas no mundo todo,
espalhando-se, usando conhecimentos
e coragem, aventurando-se no desconhecido.

Mas entre eles apareceram homens maus,
muito parecidos com os que tivemos aqui,
e resolveram colocar um freio na história deles,
prendê-los com os grilhões do desconhecimento,
com as amarras do silêncio, as algemas da dor,
matando, banindo, exilando, torturando
os poucos que venciam o medo e a acomodação.

Tornaram-se um povo triste, motivo de piedade,
por singrarem um novo mar, sem caravelas
e sem conquistas, sem vitórias... Só de lágrimas.

Mas nada é eterno, é tudo transitório,
metamorfose, véspera de modificação.

A indignação cresceu e ficou maior que o medo,
a ânsia de liberdade, maior que a acomodação.

E foram para as ruas, homem, mulher, criança,
cada um um instrumento pronto a romper correntes,
algemas, porteiras, cordões de isolamento,
cadeados... Sentindo-se ameaçados, os homens maus
recorreram às armas, único argumento dos maus.

Era primavera e vicejavam cravos em profusão,
nos canteiros, floreiras, em cada coração.
E fizeram daquelas cores e perfumes, munição.

Cada mulher com um cravo na mão: meninas,
senhoras, anciãs... Lado a lado beatas e putas,
vós e mães, esposas e amantes, namoradas,
estudantes e trabalhadoras... Todas juntas,
fazendo de passeatas, procissões, romaria
em culto a andor único, o da deusa liberdade.

E os soldados subordinados aos homens maus
apontaram armas, a mulherada com escudos de flores,
os homens na retaguarda, prontos para defendê-las,
e então começaram a fincar cravos nos canos das armas,
fazendo de cada uma delas jarra, vaso, cachepô...
Qualquer coisa imprópria à belicosidade e a morte.

Os meninos armados então se deram conta:
estavam prontos para atirar sobre suas mães,
namoradas, amantes, vós, filhas, vizinhas...
E possuídos de consciência, transbordando de amor,
deram meia volta e voltaram-se para o agressor.

E assim amanheceu vinte e cinco de abril.
Os que se apiedavam invejaram.
Só não se tornou maior quem não viu.
Francisco Costa.

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