segunda-feira, 6 de maio de 2013

Última Viagem

Última Viagem
Tenho que fazer as malas. Vou viajar.
Principio por abri-las bem devagar,
para não provocar sustos nos conteúdos,
nem despertá-los. São de uso antigo,
inúteis agora. Supérfluos, só pesam.

Primeiro livro-as dos beijos e abraços,
das carícias que guardei dobradinhas
na esperança de que não amarrotassem
nem envelhecessem desbotadas, rotas
pelo desgaste das decepções.

Agora todos os momentos de ingratidões,
quando posto em oferenda, oferecido,
não viram nada, e disseram fome
ao que se sucedeu às refeições.

Tem umas traições aqui... De amigos
em amnésia, de mulheres que não sei,
com o pudor em delito
e o coração adormecido.

Alguns domingos de chuva,
palavras duras, ásperas,
ditas em momentos de assombro,
ouvidas sempre que me permiti.

Velórios também tem. Muitos.
E em cada um deles também morri.

Tem ingratidões também.
Meu Deus, quantas! Talvez
para compensar as que cometi.

Rapaz! Quantos instantes de incredulidade,
De dúvidas, ceticismo... Racionalismo tonto
mergulhando-me em solidão e desalento.

Agora a curiosidade, esse instinto perverso
de buscar razões de ser assim e não assim,
de uma palavra dita despretensiosa
aos questionamentos transcendentais
erigindo-me pequeno deus caído,
despojado de qualquer atributo que não
a escuridão ignorante ansiando a luz.

Tem aqui algumas pretensões, ambições,
esperanças desmedidas e inalcançáveis,
certezas que se mostraram estúpidas
convicções tortas de um louco na chuva.

Pronto. Está vazia. Adeus. Vou viajar.
Devo demorar muito pra voltar.

Francisco Costa.
Rio, 16/01/2013.

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