terça-feira, 7 de maio de 2013

MAIS QUE POEMAS, POETAS


Alfabetizados, todos escrevem.
Os sensíveis vão além, aos versos.
Os mais sensíveis ainda vão mais além:
juntam versos em forma de poemas.

E há os que não param por aí,
usam os poemas como evocação da poesia
e a poesia como eternização do momento.

E tudo deveria parar por aí, mas não.
Há os que, raríssimos e excepcionais,
saltam sobre versos, poemas e até
sobre a própria poesia e fazem logo poetas.

Adeus, Dona Canô. Como nos versos
de Maiakovsky, na senhora a anatomia
ficou louca, a reduziu a só coração,
inclusive o útero, de onde brotaram poetas
que hoje choram a orfandade.

Francisco Costa.
Rio, 27/12/2012.

Para que se entenda o poema: Dona Canô faleceu no natal, aos 104 anos. Era (e é) tão querida dos brasileiros, que chegaram a escrever que Jesus veio buscar o presente no dia do seu (Dele) aniversário. Raramente falava, mas quando o fazia era para destilar uma sabedoria secular. Viu o filho preso, perseguido pela ditadura, no exílio... E de seus lábios jamais saiu uma crítica ácida, uma cobrança ofensiva. Católica fervorosa,  na verdade era ecumênica, praticamente cultuada em vida, em igrejas, templos e terreiros, pela bondade e sabedoria. Os dois poetas a que me refiro, nascidos de seu útero, são Caetano Veloso e Maria Bethânia, seus filhos enlutados, como todo o Brasil.

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