Hoje tive
uma lição de fidelidade,
da ligação
incontinente, visceral,
só
interrompida pela fatalidade:
no
vespertino de ontem, momento
em que o
mundo perde as cores
e nos obriga
a olhar para dentro
de nós
mesmos e de todas as coisas,
duas
libélulas, talvez desorientadas
diante da
ausência da bússola solar,
clandestinamente
invadiram a sala
e passaram a
se orientar, atônitas,
pelas
lâmpadas mascarando as cores,
fingindo-as
diferentes do que eram
até a pouco,
clareando minhas retinas.
Absorto com
o futebol na tela,
pouco me dei
à natureza evoluindo,
convidando-me
à contemplação.
Cansadas do
voluteio inútil, vão,
na busca do
sol orientando em luz,
libélulas
outras, distantes, alheias
antes ao
drama prestes na minha sala,
pousaram,
lado a lado, na parede
da cozinha
em penumbra, lotada
de odores e
vapores estranhos,
estrangeiros
para libélulas perdidas.
Mais tarde,
plagiador da realidade,
eu, que acendera
sóis artificiais,
agora
ordenei a manifestação do vento,
acionando o
interruptor.
Despertas,
talvez pelo movimento
do ar
anunciando o amanhecer,
ou pelos
sons inaudíveis pra mim,
por
cotidianos e repetidos, diários,
as libélulas
acordaram incrédulas
diante do
ventilador de teto, talvez
acreditando-o
uma libélula gigante,
o próprio
deus de todas as libélulas.
E voaram
todas na direção dele,
transformando-se
em nuvens de asinhas
desconectadas
dos corpinhos mortos.
Esse o meu
medo nas religiões,
o semear de
esperanças e expectativas,
o caminhar
para a morte
esperando
encontrar Deus
e só
encontrar a morte.
Francisco
Costa
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