Faz seca no nordeste,
a água tornou-se estrangeira
e tudo o que é vivo migra ou morre.
Fome e miséria fazem-se a safra desse
ano,
atípico para o governo, típico para
os locais.
Evaporam-se as plantas em verde
migrado,
transubstanciando-se palha, vida
calcinada.
O que não voa fica, e ficando morre.
Os cadáveres do gado são assépticos,
sem putrefação, sem moscas e sem
urubus
porque mortos juntos. Micróbios e
insetos,
longe, em repastos outros, distantes.
Os mortos simplesmente secam e se
partem,
o couro e as vísceras se tornando
osso,
duro, sem água, migrada para o
espaço.
Vultos humanos, espectros desseivados
caminham para lá e para cá, a espera
de chuvas, em orações secas, sem
saliva,
na paisagem uniforme, de areia e pedra.
Logo só restaria a terra que não vai
restar.
O calor levou a água,
a sede levou as plantações,
a fome, as criações.
A terra, pasto para o recomeço,
assim que o primeiro pingo se
anuncie,
vestígio último do patrimônio
evaporado
também se evapora, mas não para o céu.
Para os cofres dos bancos, abutres
tardios
cobrando dívidas de custeio,
financiamentos,
refestelando-se com títulos de
propriedade.
Um dia a água voltará, lotando
açudes,
amamentando a terra; e com a chuva
voltará o gado, a mandioca, o milho,
as flores, os pássaros, as borboletas...
Para esconder areia e pedra, fazer o
verde.
Tudo voltará, menos os homens.
Expulsos pela seca do dinheiro,
cobrados por alguém longe,
em sala refrigerada, bebendo água
gelada,
determinação de um meretríssimo de
toga
pondo em prática a legislação da
morte.
A seca tomou gado e planta
os bancos tomaram a terra.
O Brasil está morrendo de seca.
Desidratou-se a vida no nordeste,
desidrataram-se almas e corações
em todo o resto do país.
Francisco Costa
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