terça-feira, 7 de maio de 2013

DE FLAGELADOS E BANQUEIROS


Faz seca no nordeste,
a água tornou-se estrangeira
e tudo o que é vivo migra ou morre.

Fome e miséria fazem-se a safra desse ano,
atípico para o governo, típico para os locais.

Evaporam-se as plantas em verde migrado,
transubstanciando-se palha, vida calcinada.
O que não voa fica, e ficando morre.

Os cadáveres do gado são assépticos,
sem putrefação, sem moscas e sem urubus
porque mortos juntos. Micróbios e insetos,
longe, em repastos outros, distantes.

Os mortos simplesmente secam e se partem,
o couro e as vísceras se tornando osso,
duro, sem água, migrada para o espaço.

Vultos humanos, espectros desseivados
caminham para lá e para cá, a espera
de chuvas, em orações secas, sem saliva,
na paisagem uniforme, de areia e pedra.

Logo só restaria a terra que não vai restar.
O calor levou a água,
a sede levou as plantações,
a fome, as criações.

A terra, pasto para o recomeço,
assim que o primeiro pingo se anuncie,
vestígio último do patrimônio evaporado
também se evapora, mas não para o céu.
Para os cofres dos bancos, abutres tardios
cobrando dívidas de custeio, financiamentos,
refestelando-se com títulos de propriedade.

Um dia a água voltará, lotando açudes,
amamentando a terra; e com a chuva
voltará o gado, a mandioca, o milho,
as flores, os pássaros, as borboletas...
Para esconder areia e pedra, fazer o verde.

Tudo voltará, menos os homens.
Expulsos pela seca do dinheiro,
cobrados por alguém longe,
em sala refrigerada, bebendo água gelada,
determinação de um meretríssimo de toga
pondo em prática a legislação da morte.

A seca tomou gado e planta
os bancos tomaram a terra.

O Brasil está morrendo de seca.
Desidratou-se  a vida no nordeste,
desidrataram-se almas e corações
em todo o resto do país.

Francisco Costa
Rio, 04/04/2013.

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