quarta-feira, 8 de maio de 2013

AJUDAR ATRAPALHA (Visitando o meu jardim)


Cioso do dever de ajudar,
tornando-se cúmplice,
sempre as voltas com tesouras,
pazinhas, fitilhos plásticos, espátulas...
Orientei a arquitetura vegetal, as florações
nos limites do meu jardim,
escolhendo criteriosamente
o repertório de formas, cores e cheiros.

Mas adoeci e, interdito ao esforço físico,
divorciei-me da prazerosa atividade,
para perceber que não ajudava, atrapalhava.

Abandonado ao destino da autossuficiência,
logo capins de todas as espécies e tipos,
ervas rasteiras, trepadeiras, parasitas
chegaram invadindo tudo, talvez sabedoras
da vigilância interrompida.

E cresceram, ficaram adultos, floriram
e se multiplicaram, descaracterizando tudo.

Hoje resolvi avaliar o estrago e me encantei:
as sementes abundantes de capins nativos
atraíram pássaros que eu sequer supunha
existir na região. Flores modestas e simples,
nativas, tornaram-se pastos de borboletas
desconhecidas aos meus olhos em êxtase.

Chegaram predadores de multicores:
Joaninhas, gafanhotos, besouros, abelhas...
Os predadores dos predadores: pássaros,
lagartinhos, pequenas aranhas, grilos...
criando um novo tipo de jardim: sonoro.

Os periquitos e maritacas que passavam longe,
voando alto, sem motivo de aproximação,
estão me visitando, e o que eu cultivava,
rosas, bouganvilles, margaridas, dálias...
Não florescem mais em abundância,
forçadas a isso por mim atento, intervindo.

Estão de flores poucas e menores, mas felizes,
em consecução dos próprios ritmos de existência.

Já não é um jardim orientado por um homem,
mas um ecossistema que a si se basta, natural.
A fauna voltou e se estende na luz do sol,
as plantas sorriem o sorriso vegetal,
felizes como animais fugidos do cativeiro.

Libertou-se a natureza e livre está o jardineiro.

Francisco Costa.
Rio, 12/04/2013.

Nenhum comentário:

Postar um comentário