Aberto ao
mundo em evolução, estou atento
e observo
pretensões equivocadas, tortas,
medindo-as
com a mesma régua e o compasso
com que meço
a luta dos abutres e das pombas
na arena da
economia, via de mão única,
e das
vaidades, via de trânsito controlado.
Não gosto
das elites, sejam as políticas,
com a
pretensão da competência
para
gerenciar o mundo;
as religiosas,
mediando o que é só suposição
e a
realidade, com doutoral certeza
de que
íntimos dos deuses, apartados dos mortais.
As elites
fedem, porque de cheiro desconhecido
aos comuns
dos mortais, a essa gente que, triste,
quase sempre
equivocada, as sustentam.
Toda elite é
pernóstica, presunçosa, daninha,
fazendo de
si coisa acima e fora, só descendo
na hora de
se alimentar dos que julgam dentro
ou abaixo,
no umbral da ignorância e do não saber.
Sim, falo de
uma outra elite, combustível e aditivo
de todas as outras,
a pretensamente intelectual.
Só porque
com duas ou três letras à frente
no alfabeto
do conhecimento linguístico,
fecham-se em
castelos de pares, indiferentes,
alheios ao
mundo, orbitando os próprios umbigos.
Trêfegos
iludidos, crentes do saber de tudo!
Neste
universo infinito tudo é infinito, ilimitado,
a começar
pelo saber. Toda a minha sabedoria,
diante de
sabedoria maior, é ignorância.
Qualquer
coisa que eu saiba é circunstancial,
relativa, e
só faz sentido se melhora o homem.
Não gosto de
elites, e dessa também não.
A divisão em
classes outras que não a econômica
é a máscara da economia escondendo-se,
sorrateira e
disfarçada, em autossustentação.
Um dia
tivemos cristãos e gentios,
brancos e
negros, arianos e não arianos,
cristãos e
bárbaros, feudais e vassalos,
burguesia e
proletariado, e agora, os travestidos
de doutos do
muito pouco se arvoram em sábios
e nos
dividem em esclarecidos e ignaros, letrados
e iletrados,
de acesso às letras e analfabetos,
servindo aos
mesmos e de sempre propósitos.
E aí a
crítica a mim, na veia, na carne, no cerne,
porque
elogio poemas pagãos à sintaxe, hostis
à gramática,
estrangeiros à ortografia e aos pontos.
E daí?
Elogio o homem da palafita e do barraco,
o que lava
meu carro e varre a rua onde moro,
o que se
veste em liquidações e os quase nus,
os tidos
pelos doutos como fora, restos.
Mas
esqueçamos essa minha tola sociologia
de
solidariedade ao semelhante. Isso vale nada
aos vates da
perfeição redigida, bem falada,
e voltemos
ao que não consideram literatura
porque de ss
expulso pelo ç, salteador em ação
envenenando
o poema, a estética, o idioma.
Não defendo
o erro, o equívoco, a ignorância,
mas conheço
os pais desses males, e os abomino.
Condenar as
vítimas é engordar o coral dos algozes,
cantar afinadinho
no coro dos que justificam isso,
a miséria, a
divisão em classes, a fome de comida
e saber.
Ao faminto
só importa a comida.
Se servida
em prato de barro ou porcelana chinesa,
mesmo se num
prato, na travessa ou num penico,
o que
importa é a saciedade, o livrar-se da fome,
em forma de
sorrisos. Do que aflige, em versos.
Louvo Camões
e Homero, o que não me exime
de louvar os
cantadores de feiras, os cordelistas,
os poetas
populares que se mostram em versos.
Tudo nasce
popular e o tempo avalia e consagra,
se de valor:
clássico! O que se propõe, ó inocência!
De
nascimento clássico não nasce, é abortado,
surgiu para
habitar no limbo do esquecimento.
Sempre que
eu ler alguma coisa que me toque,
que tenha
sentimentos humanos, coisa de gente,
curtirei o
que se esconde por trás dos erros,
comentarei o
camuflado nos equívocos,
compartilharei
sentimentos mal redigidos,
ainda que não nascidos das penas douradas
ainda que não nascidos das penas douradas
dos
sacrossantos anjos proprietários da verdade,
reduzida a
saber escrever sem cometer erros.
Francisco
Costa
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